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David Macedo

Quando damos as boas-vindas a alguém demonstramos a alegria de um reencontro ou a expectativa do início de uma nova amizade. A proximidade faz com que as almas se toquem e por um momento dividam entre si a deliciosa sensação de estar diante de uma pessoa que naquele momento faz parte da nossa vida.” (Luis Alves)

Início de setembro, sozinho, com vontade renovada e pensamentos otimistas, o professor, um pouco nervoso, permanece inerte naquela sala vazia, seca, humilde. Vinte e cinco anos, mais dez, a repetir a mesma rotina. Prepara tudo com rigor e mentaliza-se para aquele momento mágico. É bom sentir tudo como uma eterna novidade! O que poderia ser uma rotina, acaba por ser um desafio constante. Gosta de ser professor, de ser educador, de todos os anos começar uma nova aventura, uma nova viagem pelo mundo do saber com novos e desconhecidos passageiros. Cada ano, uma viagem nova e diferente. É preciso navegar! Construir sonhos! Abrir portas. É urgente criar espíritos críticos. Desenvolver um verdadeiro e saudável trabalhar em equipa. O professor é um eterno capitão determinado, que navega pelo mar do conhecimento. Naquele dia, tudo é mágico!

Os alunos chegam geralmente felizes, faladores, limpos, arejados. É assim todos os anos. Mas há sempre aqueles que entram sem um sorriso, com a seriedade própria de gente maior. Os alunos são vida, notas de música, melodia, condimentos… Os alunos são verdadeiramente a alma da escola, a sua energia, o seu palpitar, o seu encanto.

A entrada na sala de aula é geralmente juvenil, barulhenta. Uma vez sentados, e no meio de muitos sorrisos e algumas perguntas um pouco descabidas, há aquele momento de silêncio em que vemos todos os holofotes dirigidos para o mesmo alvo: o professor! É assim todos os anos e todos os anos é preciso começar bem. Ele sabe-o por experiência. “Que vedes no quadro?!” Todos os alunos se fixaram num enorme cartaz colado lá antecipadamente.

– Um boneco, senhor professor! Uma frase! … Cores!…
– Sim, mais.
– Uma mensagem, professor.
– Muito bem. Uma mensagem. Que mensagem?
– “Descobre a tua luz, és uma estrela!”
– Quem quer explicar?

Cada aluno que estava ali, à sua frente, era desafiado a descobrir essa luz que a tudo dá significado, esse conhecimento que nos transforma em seres superiores. Ninguém queria ser estrela apagada, estrela sem brilho. É preciso iluminar o mundo a partir do nosso interior com novos saberes, novos valores. O professor estava ali, para os ajudar nessa aventura tão maravilhosa, incentivando cada aluno a descobrir essa luz, a ser essa pequena estrela que deve brilhar na humanidade cheia de medos, de depressões, de injustiças. Que estava ali, amigos, para os acompanhar nessa viagem maravilhosa ao mundo do conhecimento, da luz.

Todos querem falar. É preciso por ordem. O professor paciente, junto ao quadro negro, olha-os de frente, fixa os seus olhares e, como por magia a plateia acalma novamente. Muito bem, dizia ele, que iam colar uma estrela nas costas, uma estrela branca. Que iam andar pela sala a ouvir uma música suave. Quando ele parasse a música, cada aluno aproximar-se-ia do colega que estivesse à sua beira e diria duas palavras positivas e justificativas que pudessem definir as férias. Voltam a divagar pela sala a pensar em duas qualidades e dois defeitos. A música voltava a parar e dois a dois comentavam. Por fim, escrevem na estrela colada nas costas dos companheiros as palavras que eles disseram. Feito este trabalho, novamente os alunos se dirigiam aos seus lugares e as estrelas são colocadas no placar da sala de aula. Seguidamente, o aluno é convidado a escrever três qualidades e dois defeitos numa outra estrela amarela mais pequena que a anterior e por fim coloca-a sobreposta à anterior. Houve um breve comentário. O exterior e o interior interagem, convergem, existem ao mesmo tempo em cada um de nós. Nesse novo ano, iriam trabalhar o exterior: as matérias disciplinares, as destrezas visuais, motoras, mas, ao mesmo tempo, diligenciariam momentos para cuidar o interior cultivando os valores sublimes como o respeito, o trabalho, a disciplina, a camaradagem, a solidariedade, a tolerância…

O que espera o professor de cada um dos seus alunos? Resume-o numa única palavra que escreve no quadro branco: Excelência! “Ah que bom seria se todos se empenhassem a sério naquilo que iriam ter pela frente no novo ano letivo que iniciava! Excelência no trabalho, nos resultados, excelência nas relações humanas, excelência na aquisição de novos valores, excelência no pensar, no agir”.

Excelência é respeitar o ritmo de cada um e pedir-lhes, ajudando-os, para que se esforcem para dar o seu máximo.

Cada um parte da sua realidade e superar-se dentro das suas limitações. Todos são capazes de ser um pouco mais excelentes. Ele sabe que é preciso respeitar o ritmo de cada um. O importante é nunca desistir perante os imensos obstáculos.

Depois de um breve trabalho a pares, o professor apresenta a estratégia para atingir a excelência. Desenha no quadro a estrutura de um campo de futebol e pergunta aos alunos onde gostariam de estar: se nas bancadas ou no relvado, se nos bancos dos suplentes ou fora do estádio. Como quase todos respondem que dentro do campo, “o treinador” junta-os no centro da sala como se de uma equipa se tratasse e baixinho vai-lhes transmitindo uma série de princípios. Que eram um grupo. Todos deviam trabalhar para o mesmo, nunca deviam faltar aos treinos, ele estava ali para os incumbir a dar sempre o seu melhor; era importante não desistirem, mas antes procurarem novas estratégias. O campo era deles, não seu. Eles eram o centro da aprendizagem. Iam sofrer muito, mas o importante era nunca desistirem. Tinham que animar os colegas desmotivados. O trabalho em equipa é fundamental! Espero que a entreajuda esteja sempre presente nessa equipa! Ele era, somente, um “treinador”. Ia estar muito atento e, ali, a sua função era muito clara. Tudo faria para que a equipa atingisse a excelência, bons resultados dentro e fora de campo. Ouviu-se, então, o grito de guerra: “Um por todos e todos por um!”; “Descobre a tua luz, és uma estrela!”.

Regressados aos seus lugares, os alunos comentam a importância do grupo, e apresentam uma série de sugestões para o bom funcionamento do grupo. Por fim, preenchem o projeto pessoal.

A apresentação estava feita. O “barco” voltava a ficar vazio. No corredor, o professor continuava a ouvir, ainda penduradas por todos os cantos, as risadas e as conversas dos alunos que por ali passaram. Uma vez no recreio, levanta o olhar e vê-os felizes, a conversarem uns com os outros, a jogar.

Este ano promete! Há alegria no ar, é um bom sintoma para enfrentar a viagem de mais um ano letivo que acabara de iniciar. Boa sorte!

David Macedo